terça-feira, 8 de abril de 2014

Sobre o sol e estrelas.


Num impulso pesarosamente nostálgico, naquele dia decidi ir à praia.
Tomei o ônibus costumeiramente às 16h sem grande cerimônia, ainda que o trajeto tenha sido de todo digno de um funeral. Decidi que durante o caminho me desfaria de todas as lembranças dela; deixaria nosso primeiro beijo na esquina aqui de casa, o primeiro filme que assistimos juntos logo ali no ponto, o dia em que nos escondemos de seus pais quando chegasse perto do museu, e até mesmo tinha por intenção levar o nosso finado aniversário de relacionamento para que fosse enterrado na praia. Se ali deu seus primeiros passos, porque eu não haveria de ter uma obrigação senão religiosa de deixar que descansasse em paz ali mesmo?

Quando já em terra, tirei os chinelos e fiz o caminho até o quebra-mar em ritual. Deixei que meus pés aderissem a areia e que o vento fizesse seu curso pouco suave em meus cabelos. Quis até por um momento ser parte daquela praia, quis entregar todo o destino das memórias dela ao mar. Que fosse sepultada e se perdesse nas ondas, meu amor. Mas não voltasse pra mim.

Mas quem diria... Ao chegar às pedras finais me sentei e me desfiz. As memórias que eu tentei afogar e que eu pensava já ter deslizado das minhas mãos haviam se agarrado em mim com tal voracidade que agora era eu quem me sentia tragado. Será que fui junto a elas ou são elas que relutam em não ir? Ah! Balancei a cabeça: quero voltar a mim. Se eu fui ou se se fiquei, não sei. Naquele momento eu só queria não me deixar lutar e assistir o finalzinho do pôr do sol.
Enquanto eu olhava para o horizonte vendo o sol ir embora, tudo que conseguia ver era a luz se dissipando através dos tons quentes de seus cabelos. Mas viria a noite. E se viesse? Que é da mesma noite depois que um meteoroide rasga o céu?

Fechei os olhos e tentei visualizar meu próprio crepúsculo, minha zona de conforto; inócua e imaculada. Tudo que eu sei é que contrário aos ainda pequenos remanescentes desejos que aquele meteoroide rasgasse novamente meu céu e queimasse em laranja e vermelho o pálido azul, não foi isso que vi. Talvez a melhor parte e mais surpreendente da visualização, do futuro ou do presente, é que em nosso íntimo não está intrinsecamente ligada à nossa memória romântica. E foi igualmente surpreendente como no crepúsculo da minha vida tudo o que eu pude ver e desejar naquele momento foi um visível tom dourado ascendendo. De estrelas, talvez. Eu apenas soube que qualquer fosse o meu destino ou o que havia sido reservado para mim, eu ainda poderia ver minha vida queimar em tons quentes.

Pouco depois de haver terminado minhas devidas honras, olhei para trás por habito. Por traição da nostalgia ou memória visualizei o rastro luminoso perdido no espaço. Tal fosse a lembrança ou a bondade com que meus olhos me guiaram, o que posso dizer é que à noite- ou especialmente naquela -chovia estrelas.
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